Palestra sobre "GUARDA COMPARTILHADA" promovida pela Coordenadoria das Varas de Família do TJSP.
Participação na palestra da Associação Brasileira para Igualdade Parental.
A Palestra ocorreu no dia 26 de junho de 2014 na Sala do Servidor no Fórum João Mendes Júnior, foi iniciativa do Tribunal de Justiça à partir da
demanda de pais e mães descontentes com a atuação do poder
judiciário, brilhantemente orientado pela coordenadora da CFS,
Mônica Nardy Marzagão, teve um excelente número de espectadores,
tanto presenciais como distribuídos em 110 comarcas pelo sistema
EAD.
É
de rigor destacar aqui o caloroso acolhimento do Tribunal de Justiça
para com o pleito social, no sentido de orientar os servidores nos
diversos níveis sobre os problemas sentidos pelos jurisdicionados.
O
seminário contou com a palestra da juíza da 1ª Vara da Família e
Sucessões do Foro Regional de Pinheiros, Daniela Maria Cilento
Morsello; a advogada e membro da Associação para Igualdade
Parental, Carolina Klocher Ferreira; e o especialista em
Administração de Empresas e membro fundador da Associação,
Roosevelt Carlos Abbad.
O
seminário foi aberto por Mônica Marzagão, que posteriormente
passou a palavra para a palestrante Daniela Maria Cilento Morsello.
Morsello
iniciou sua fala apresentando premissas embasadoras do sislogismo que
explanou ao longo da palestra.
Dentre
tais premissas, com a devida vênia, manifesto minha divergência com
relação à uma delas, no tocante ao que designaria o significado da palavra
“guarda”, como termo jurídico.
Segundo
a magistrada, embasada no pensamento do Desembargador José Antônio de Paula Santos, a
guarda definiria a “posse” do guardado.
Contudo
é imperioso observar que a à Luz da Constituição Federal de 1988,
toda a criança é considerada sujeito de direito individual, sem
distinção dos demais, conforme rege o artigo 5o, senão
pela necessidade desta de ter cuidados especiais assegurados,
conforme coloca o Art 227.
É
de suma importância observar que o “guardião” está na condição
de alguém que tem a obrigação de cuidar e resguardar os direitos
do guardado, jamais podendo se equiparar a um “proprietário” do mesmo,
como era visão costumeira antes desta constituição.
Gize-se infeliz a utilização do termo “posse”, mesmo que referindo-se meramente ao poder familiar, ou a guarda física, visto que é dever do guardião a responsabilidade de proteger, tutelar, resguardar seus interesses mas jamais apoderar-se da pessoa do guardado. A utilização desse termo tem uma função contra-pedagógica.
Além
disso, Morsello definiu claramente a distinção entre os institutos
da guarda material e da guarda jurídica e de maneira brilhante e
didática sintetizou o funcionamento dos modelos de guarda possíveis
em nosso ordenamento jurídico, dividindo-as em grupos, sendo o de
guardas unilaterais, guarda conjunta ou guarda compartilhada.
Discorreu
sobre o princípio do melhor interesse do menor, argumentando
entretanto que tal princípio teria sido deixado pelo poder
legislativo propositalmente com uma margem de interpretação
subjetiva, face a uma suposta ausência de elementos objetivos na
redação das leis.
Novamente
peço vênia para divergir do entendimento da n. magistrada, uma vez
que olvida a presença latente de premissas objetivas em nossa
legislação para compor o inferimento de tal princípio, senão
vejamos:
A
Convenção para os Direitos da criança, decreto 99.710/90, inseriu
em nossa Constituição Federal o princípio dos direitos de toda a
criança. Ela positivou em nosso ordenamento jurídico o termo “o
interesse maior da criança”, bem como fixou o compromisso do
Estado com a “proteção e o cuidado” com a mesma.
Vejamos
a redação do Artigo 3:
1.
Todas as ações relativas às crianças, levadas a efeito por
instituições públicas ou privadas de bem estar social, tribunais,
autoridades administrativas ou órgãos legislativos, devem
considerar, primordialmente, o interesse maior da criança.
2.
Os Estados Partes se comprometem a assegurar à criança a
proteção e o cuidado que sejam necessários para seu bem-estar,
levando em consideração os direitos e deveres de seus pais, tutores
ou outras pessoas responsáveis por ela perante a lei e, com essa
finalidade, tomarão todas as medidas legislativas e administrativas
adequadas.
Restou
claro no interior do aludido dispositivo legal que este tratou de
inserir positivamente “o interesse maior da criança” bem como a
“proteção e o cuidado” com a mesma.
Dentre
estes interesses, a redação do Artigo 18 traz taxativamente um
deles:
1.
Os Estados Partes envidarão os seus melhores esforços a fim de
assegurar o reconhecimento do princípio de que ambos os pais têm
obrigações comuns com relação à educação e ao desenvolvimento
da criança. Caberá aos pais ou, quando for o caso, aos
representantes legais, a responsabilidade primordial pela educação
e pelo desenvolvimento da criança. Sua preocupação fundamental
visará ao interesse maior da criança.
Partindo
para a legislação infra-constitucional, a lei 8.069 de 13 de julho
de 1990 (ECA) foi criada com o objetivo de regulamentar o dispositivo
constitucional acrescido pela Convenção para os direitos da Criança
e do adolescente de 1989.
O Art. 1o do aludido dispositivo legal define que este
“dispõe sobre a proteção integral à criança e ao
adolescente”.
Neste ponto é essencial destacar, alguns trechos da redação:
Art.
4º É dever da família, [...] e do poder público assegurar, com
absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à [...]
à convivência familiar e comunitária.[...]
Art.
5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de
negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e
opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou
omissão, aos seus direitos fundamentais.
Art.
19. Toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e
educado no seio da sua família[...], assegurada a convivência
familiar e comunitária[...]
Art.
21. O pátrio poder poder familiar será exercido, em igualdade de
condições, pelo pai e pela mãe[...]
Art.
22. Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação
dos filhos menores[...]
Art.
24. A perda e a suspensão do poder familiar serão decretadas
judicialmente, em procedimento contraditório, nos casos previstos
na legislação civil, bem como na hipótese de descumprimento
injustificado dos deveres e obrigações a que alude o art. 22.
O
Código Civil prevê taxativamente que a perda do poder familiar
ocorrerá, em procedimento contraditório apropriado e exclusivamente
nas hipóteses elencadas nos artigos 1.635 à 1.638 daquele
dispositivo.
Portanto,
resta claro que embora haja margem para interpretação subjetiva
sobre o que comporia o superior interesse da criança, é imperioso
observar também a presença de vários elementos objetivos
positivados nesses dispositivos legais, elementos esses que devem ser
considerados na composição do que seria esse superior interesse.
Morsello
explanou de forma brilhante que a guarda jurídica é parte
integrante do poder familiar e distingue-se da guarda material que
refere-se à custódia física do guardado. Afirmou exclusivamente
que a guarda compartilhada refere-se ao compartilhamento da guarda
jurídica e aludiu ainda que a guarda unilateral esvazia, na prática,
o poder familiar do genitor não guardião.
Concordo
que a Guarda Unilateral, na prática, esvazia o poder familiar do
genitor não guardião. Contudo, vale ressaltar duas constatações
importantes observando o Código Civil:
Art.
1583 [...]
§
1o Compreende-se por guarda [...] compartilhada a
responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres
do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao
poder familiar dos filhos comuns.
A-)
Embora a guarda compartilhada refere-se expressamente ao
compartilhamento da guarda jurídica, é de rigor a constatação de
que o compartilhamento da custódia física está intrínseco aos
direitos e deveres em relação ao menor, além de favorecer esse
compartilhamento da guarda jurídica como um todo e portanto, deve
ser aplicado sempre que possível.
B-)
A legislação é taxativa quanto a impossibilidade da perda
ou da suspensão do poder familiar, portanto também da guarda
jurídica ou Guarda Compartilhada, senão nas hipóteses supra
aludidas.
Vejamos
o que mais diz o Código Civil:
Art.
1.632. A separação judicial, o divórcio e a dissolução da união
estável não alteram as relações entre pais e filhos senão quanto
ao direito, que aos primeiros cabe, de terem em sua companhia os
segundos.
Assim,
fica claro que a perda ou suspensão desta parte integrante do poder
familiar (guarda jurídica ou compartilhada), somente é possível
nas hipóteses previstas nos artigos 1.635 à 1.638 do Código Civil.
A
Guarda Unilateral esvazia na prática o poder familiar, portanto na
atual legislação, sua aplicação é ilegal, pois
se dá ao arrepio da lei, senão em casos graves definidos pelo
ECA ou pela lei da Alienação Parental, ou nas hipóteses de perda
ou suspensão do poder familiar previstas pelo Código Civil.
Argumentou
ainda que parte dos juristas brasileiros tem entendido que para
preservar o melhor interesse do menor, seria necessário aplicar a
Guarda Compartilhada somente nos casos onde os genitores se
relacionam bem.
Olvidou
no entanto salientar que tal interpretação se dá ao arrepio da lei
quando não devidamente fundamentada em provas com experiências
empíricas ou em estudos científicos devidamente validados. Decisões
tão aviltantes não poderiam serem concebidas com fulcro em
“achismos”.
Morsello
citou Rolf Madaleno como doutrinador que supostamente estaria
militando contra a aplicação da Guarda Compartilhada compulsória,
quando na verdade é o contrário, pois é notório que o mesmo hoje
milita no sentido oposto, ou seja, milita pela aplicação da Guarda
Compartilhada compulsória como pode ser constatado por sua própria
fala em palestra proferida para a OAB/SP, disponível na Internet,
dividida em quatro vídeos que podem ser acessados pelos links
abaixo:
Grifo aqui a conclusão do pensamento de Rolf Madaleno, no quarto vídeo, na defesa da aplicação da lei da Guarda Compartilhada, mesmo na ausência de acordo entre as partes.
Verifica-se também o pensamento de Rolf Madaleno em sua obra Curso de Direito de Família, 4a. Edição (2011), P-435, Editora Forense:
Talvez tenhamos que começar a olhar com mais atenção para os países de sangue frio, nos quais a guarda compartilhada é imposta independentemente da resistência ou contrariedade da concordância do outro genitor, no comum das vezes representado pela mãe, que vê no pai inimigo e coloca toda sorte de obstáculos para o estabelecimento de uma custódia repartida da prole. A continuidade do convívio da criança com ambos os pais é indispensável para o saudável desenvolvimento psicoemocional da criança, constituindo-se a guarda responsável em um direito fundamental dos filhos menores e incapazes, que não pode ficar ao livre, insano e injustificado arbítrio de pais disfuncionais. A súbita e indesejada perda do convívio com os filhos não pode depender exclusivamente da decisão ou do conforto psicológico do genitor guardião, deslembrado-se que qualquer modalidade de guarda tem como escopo o interesse dos filhos e não o conforto ou a satisfação de um dos pias que fica com este poderoso poder de veto.
Talvez seja o momento de se recolher os bons exemplos de uma guarda compartilhada compulsória, para que se comece a vencer obstáculos e resistências abusivas, muito próprias de alguma preconceituosa pobreza mental e moral, e ao impor judicialmente a custódia compartida, talvez a prática jurídica sirva para que pais terminem com suas desavenças afetivas, usando os filhos como instrumento de suas desinteligências, ou que compensem de outra forma suas pobrezas emocionais, podendo ser adotadas medidas judiciais de controle prático do exercício efetivo da custódia compartilhada judicialmente imposta, como por exemplo, a determinação de periódicos estudos sociais, sob pena do descumprimento implicar a reversão da guarda que então se transmuda em unilateral.
Não
apenas Rolf Madaleno, mas também é de se ressaltar que inúmeros
outros doutrinadores atualmente defendem a aplicação da Guarda
Compartilhada compulsória, como é o caso de Waldyr Grisard Filho,
Maria Berenice Dias, Fátima Nancy Andrighi, entre outros.
Inúmeros estudos científicos e psicológicos concluem para a importância da participação de ambos os genitores na formação dos filhos, desde a primeira infância.
Nesse sentido os palestrantes posteriores, representantes da Associação para Igualdade Parental demonstraram que nossas jurisprudências antigas em favor da guarda unilateral caminham na contra-mão da ciência, da saúde e do bem-estar dos menores.
Adriano da Silva
Membro Fundador da Associação Brasileira para Igualdade Parental.
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Acesse também neste Blog:
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Entenda a Guarda Compartilhada, Guarda Jurídica e Guarda Material
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Direito de convivência da Criança é indisponível - Lei dos avós
Adriano da Silva
Membro Fundador da Associação Brasileira para Igualdade Parental.
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