O TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO, EM DECISÃO INÉDITA, REFORMA SENTENÇA DECRETANDO A GUARDA COMPARTILHADA MESMO EM CASO DE LITÍGIO, COM BASE NA NOVA LEI 13.058/2014, COM DIVISÃO DE TEMPO EQUILIBRADO E INDICAÇÃO PARA REVISÃO DE PENSÃO ALIMENTÍCIA.
JURISPRUDÊNCIA TAMBÉM APLICA LEI 12.318/2010 DA ALIENAÇÃO PARENTAL.
VOTO
Nº 11920 APELAÇÃO Nº 0002251-96.2011.8.26.0004 COMARCA: SÃO PAULO
APTE.: A.S.C APDA.: T.M.A.C. GUARDA – PRETENSÃO DO PAI DE EXERCER GUARDA
COMPARTILHADA DO MENOR LAUDO PSICOSSOCIAL FAVORÁVEL MELHOR ATENDIMENTO
DOS INTERESSES DA CRIANÇA DESAVENÇAS ENTRE O EX-CASAL QUE NÃO PODEM
SERVIR DE OBSTÁCULO ALIENAÇÃO PARENTAL – CONDUTA DA GENITORA QUE SE
AMOLDA EM AO MENOS DUAS DAS HIPÓTESES DESCRITAS NO PARÁGRAFO ÚNICO DO
ARTIGO 2º DA LEI 12.318/2010 – REALIZAR CAMPANHA DE DESQUALIFICAÇÃO DA
CONDUTA DO GENITOR NO EXERCÍCIO DA PATERNIDADE OU MATERNIDADE (INCISO I)
– DIFICULTAR CONTATO DE CRIANÇA OU ADOLESCENTE COM GENITOR (INCISO III)
APLICAÇÃO DE MEDIDA DE ADVERTÊNCIA AO ALIENADOR SENTENÇA IMPROCEDENTE
SUCUMBÊNCIA INVERTIDA – DADO PROVIMENTO AO RECURSO
O
apelante insurge-se contra sentença a fls. 319, cujo relatório adoto,
que julgou improcedente pedido de guarda compartilhada e de alienação
parental e atribuiu à mãe a guarda do menor, observado o direito de
visitas do pai em finais de semana alternados e todas as quartas-feiras,
com pernoite, retirada e devolução do menor na escola em ambos os
casos
Imputa à apelada prática de atos de alienação parental.
Assevera
que a guarda compartilhada não só é melhor para o menor, como também
servirá para amenizar os efeitos da aludida alienação parental. Pede a
procedência do pedido de alienação parental e de guarda compartilhada.
De forma subsidiária, requer a divisão das férias do mês de dezembro.
Em contrarrazões, a parte apelada sustenta a lisura da sentença.
O
Ministério Público opina pelo provimento parcial do recurso apenas para
repartir as férias de dezembro do menor entre as partes.
É o relatório.
Da guarda compartilhada.
O
art. 1583, § 1º, do Código Civil define a guarda compartilhada como
sendo “a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres
do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder
familiar dos filhos comuns”.
Ainda
segundo o art. 1584, § 2º: “Quando não houver acordo entre a mãe e o
pai quanto à guarda do filho, encontrando-se ambos os genitores aptos a
exercer o poder familiar, será aplicada a guarda compartilhada”.
Um
dos intuitos da guarda compartilha é evitar que os filhos, no caso de
separação e divórcio dos pais, se transformem, no mais das vezes, em
órfãos de pai ou mãe vivos.
Para
que a guarda compartilhada dê certo é preciso que os pais revejam
certos conceitos, deixem de lado toda a mágoa fruto do término do
relacionamento, nem sempre amigável, em prol de um interesse maior o bem
estar do filho em comum.
Conforme
ressalta Waldir Grisard Filho, em seu livro Guarda Compartilhada: um
novo modelo de responsabilidade parental: “não é o litígio que impede a
guarda compartilhada, mas o empenho em litigar, que corrói gradativa e
impiedosamente a possibilidade de diálogo e que deve ser impedida, pois
diante dele ‘nenhuma modalidade de guarda será adequada ou conveniente.”
(4ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, pag. 205).
O
Poder Familiar existe para a proteção da prole, e pelos interesses
dessa é exercido. Não pode ser usado para contrariar esses mesmos
interesses.
Os
elementos constantes dos autos, em especial os estudos realizados pelo
setor técnico do juízo, demonstram que tanto o pai quanto a mãe reúnem
condições de exercerem a guarda do menor.
O
apelante, ao que atesta o laudo psicossocial, apresenta recursos
internos que lhe possibilita o exercício do papel paterno com
compromisso e responsabilidade, não sendo observado óbices, a nível
psicológico, que contraindiquem a possibilidade de divisão igualitária
dos direitos e deveres do filho com a Srª T., através do
compartilhamento da guarda, fls. 243.
Os
argumentos apresentados pela apelada para se opor à guarda
compartilhada diz respeito, muito mais, a questões relacionadas à
ruptura mal elaborada da separação, e não a uma inadequação ou
desqualificação do Sr. A. no desempenho do papel paterno, cuidados e
proteção de Dante, fls. 244.
Ainda
segundo relatos da assistente social, “a genitora se dedica ao filho e
cuida regularmente dele, mas sua atitude de negar visitas ao pai não se
justifica, o fato dele ter um relacionamento amoroso não o impede de
exercer visitas e de ter momentos com o filho, e participar de seu
desenvolvimento”, fls. 103.
O
relatório psicossocial atesta, fls. 243, que a apelada permanece “presa
aos conflitos relacionados ao término do casamento, denotou não
conseguir distinguir os papéis de esposo e pai, exercido pelo Sr. A.,
(…), por ele ter falhado enquanto marido, ele falhou também enquanto
pai, por isso, sem condições de assumir os cuidados com Dante”.
Acrescenta que ela não poupa o menor D. de suas impressões e sentimentos
negativos relacionados a figura do Sr. A., e também das mágoas em
relação a ele.
No
tocante aos aspectos financeiros, os estudos demonstram que a apelada
apresenta “dificuldades em administrar o novo estilo de vida, após
separação”. Ressalta que o menor D. não foi poupado dessa queda
acentuada, tanto que saiu de um colégio de alto padrão e passou a
frequentar escola pública, fls. 244. E não só, a apelada utiliza a
pensão paga ao filho para suprir as necessidades da casa, tanto as do
menor como as suas.
O
menor D., conforme estudos, mostrase desorientado e angustiado. Parece
não ser poupado das desavenças existentes, verbalizando detalhes sobre
as brigas (episódio da confusão no colégio, por exemplo) e pendências
financeiras (impossibilidade de voltar a frequentar o colégio antigo),
questões que vão além de sua capacidade de compreensão e amadurecimento,
e que não lhe dizem respeito, mas que contribuem para que ele se
fragilize e passe a sofrer inseguranças internas. Em suas verbalizações,
D. responsabiliza o pai por todo o ocorrido, embora pareça não ter
ainda consciência do conteúdo de suas falas.
Conduta
essa que, no entender da técnica, pode contribuir, gradativamente, para
que ele passe a considerar esse pai como o algoz, a desconsiderá-lo,
passando a rechaça-lo e aos seus familiares, fls. 242.
Frente
a todo esse quadro, a manutenção da guarda unilateral, em prol da
apelada, não é recomendada pela psicóloga do juízo, em especial, porque
estimula e propicia campo fértil para o surgimento de atos de alienação
parental.
Se
assim o é, forçoso reconhecer, que o melhor para o menor é o convívio
simultâneo com os pais, de modo que a guarda compartilhada é a medida
que se impõe.
Cada
um dos pais deverá ter a criança, de forma alternada, de segunda a
segunda, retirando-a na escola, após término da aula. Nesse período a
custódia física da criança permanecerá com o guardião daquela semana,
alternando-se sucessivamente.
Com
relação às festas de fim de ano, um ficará no Natal e o outro na
Confraternização Universal (primeiro dia do ano), respeitada a
alternância. Cada um terá a criança em sua companhia por 15 dias nas
férias escolares de meio e fim de ano, também alternadamente
Nas
datas comemorativas do dia dos pais e das mães, assim como na data de
aniversário dos genitores, o menor deverá permanecer em companhia do
pai, ou da mãe, a depender da situação, independente de quem for o
guardião naquela semana.
O aniversário do menor será comemorado, de forma alternada entre os pais. Ano com um, ano com outro.
Ressalto,
por fim, que a guarda compartilhada altera a obrigação alimentar frente
ao filho. Questão essa que deve ser dirimida pelas partes através de
ação própria, já que não há elementos nos autos para decidir o assunto.
Da alienação parental.
O
art. 2º da Lei 12.318/2010 considera como ato de alienação parental a
interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente
promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que
tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou
vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao
estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.
Da
análise detida dos elementos colhidos ao longo da instrução processual
constatese que a conduta da genitora, almoda-se, ao menos, em duas das
hipóteses descritas no parágrafo único do aludido artigo: realizar
campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da
paternidade ou maternidade (inciso I) e dificultar contato de criança ou
adolescente com genitor (inciso III).
Os
diversos boletins de ocorrência lavrados pelas partes demonstram os
inúmeros obstáculos criados pela apelada para impedir, ou menos
dificultar, o exercício do direito de visitas pelo apelante, pai do
menor. Ora notícia de maus tratos inexistentes, ora descumprimento
deliberado de decisão judicial que fixa visitas, ora agressões físicas e
ameaças entre as partes.
Apenas
a título de exemplo, note-se que em uma das ocasiões descritas no
boletim de ocorrência, a apelada, por ocasião de um evento comemorativo
do dia dos pais, no colégio onde o menor estudava, retirou-o,
abruptamente, dos braços do apelante, e logo em seguida agrediram-se
mutuamente. Agressões essas extensivas até mesmo às avós do menor que
também estavam presentes no local, fls. 189 e 193 dos autos principais.
E
não só. O estudo social corrobora a prática de alienação parental ao
recomendar à apelada que não se valha de expedientes para dificultar as
visitas, afinal o “requerente é o pai de seu filho e sempre o será,
mesmo não sendo mais seu marido”, fls. 103. No mesmo sentido, o laudo
psicossocial ressalta que a apelada não poupa o menor D. de suas
impressões e sentimentos negativos e também das mágoas que nutre em
relação ao pai dele, fls. 244. Mostra-se ressentida e magoada com o
exmarido, inconformada com a separação, com a queda da qualidade de vida
e, de forma velada, aparenta desejo de retaliação, fls. 243.
Caracterizados
atos típicos de alienação parental, reputo como suficiência, para fazer
cessar tal conduta, a medida de advertência ao alienador. Sem prejuízo
da adoção de penalidade mais gravosa caso essa não surta o efeito
esperado, tudo nos termos do art. 6º da Lei 12.318/2010.
Pelo
meu voto, dou provimento ao recurso. Despesas pela apelada-ré, que
condeno ao pagamento das custas processuais e honorários de advogado,
que arbitro, por equidade, em R$ 2.000,00, para as duas ações, principal
e apenso.