domingo, 16 de março de 2014

DISTÂNCIA ENTRE AS RESIDÊNCIAS E O EXERCÍCIO DA GUARDA COMPARTILHADA.

Inúmeras desculpas são utilizadas por genitores egoístas, aceitas por magistrados conservadores e despreparados na tentativa de justificar o impedimento da adoção do modelo de guarda compartilhada quando não há consenso entre os genitores.

O trabalho das Dras. Leila Maria Torraca de Brito e Emmanuela Neves Gonsalves acerca do tema , destaca que:

o entendimento exposto em grande parte da jurisprudência encontrada foi o de que a guarda compartilhada não deve ser aplicada quando os genitores residem em localidades distintas, como aponta a seguinte argumentação: “Não há falar em guarda compartilhada quando os genitores residem em cidades diversas [...]” (Proc. no 70022656870 – TJRS).

A literatura sobre o tema aponta, todavia, que a noção de guarda compartilhada vai além da preocupação com dias, horários e formas de deslocamento das crianças e dos pais, como alertam Brito e Gonsalves (2009):

Ao se determinar a guarda compartilhada, indica-se aos pais a importância que o Estado atribui à convivência familiar da criança. Com esse entendimento, pode-se ultrapassar a dúvida sobre os arranjos concretos de guarda para se valorizar o aspecto simbólico da guarda compartilhada, que permite deixar de lado a interpretação de que haveria um pai principal e um secundário (Brito e Gonsalves, 2009, p. 80).

O relator de um acórdão, no Rio Grande do Sul, apesar de não deferir a guarda compartilhada por entender que esta não deveria ser imposta aos pais, aponta que:

Embora as partes não residam na mesma cidade, o ideal no caso dos autos seria a guarda compartilhada” (Proc. no 70033272063 – TJRS).

Assim, acredita-se que, nesse caso, essa variável não seria impeditiva para a aplicaçãoda guarda compartilhada.

Em pesquisa empreendida com pais e mães separados, Brito (2001) relata o caso de uma brasileira que se divorciou na França, onde também moravam o ex-marido e o filho em comum. No processo de divórcio, no país em questão, foi designada a autoridade parental conjunta, modalidade correlata à guarda compartilhada no Brasil, fato que não constituiu impedimento para que a entrevistada voltasse para seu país de origem com a criança, após a separação. O exercício da autorida de parental conjunta entre pai, residente na França, e mãe, residente no Brasil, ocorria por meio do contato a distância. Além de aceitar opiniões do ex-marido quanto à educação do filho, ela, ainda, “Envia sempre boletins escolares, trabalhos e desenhos, preocupada com a preservação dos laços do filho com o pai” (Brito, 2001, p. 24).


A guarda compartilhada, muito além de uma divisão estrita de dias e horários que os filhos passam com os pais, consiste na responsabilização de ambos os genitores quanto à educação e ao cuidado de seus filhos, funcionando como um suporte social simbólico que fornece sustentação à dimensão privada dos papéis parentais. A colaboração de ambos os pais na educação dos filhos após uma separação conjugal também irá depender do conjunto de significações e referências inscritas no contex to social. Por derradeiro, pode-se lembrar, ainda, que a legislação brasileira não fixa limites da distância que poderia existir entre a residência de cada um dos pais para que possa ser aplicada a guarda compartilhada.” – GUARDA COMPARTILHADA: ALGUNS ARGUMENTOS E CONTEÚDOS DA JURISPRUDÊNCIA – REVISTA DIREITO GV, São Paulo – 9(1) | P. 308 | JAN-JUN 2013 


Leila Maria Torraca de Brito
PROFESSORA ADJUNTA DO INSTITUTO DE PSICOLOGIA DA
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO (UERJ)
MESTRE DOUTORA EM PSICOLOGIA PELA PUC/RJ
PÓS-DOUTORA EM DIREITO PELA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ
torraca@uerj.br

Emmanuela Neves Gonsalves
ESPECIALISTA EM PSICOLOGIA JURÍDICA PELA
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO (UERJ)
PSICÓLOGA

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